"O texto abaixo estava num dos
meus arquivos a serem usados nas aulas de produção de texto. Os alunos falam
muito sobre a necessidade quase inexistente de alguns assuntos nas aulas de
Português. Não tiro a razão deles, mas
assuntos “bobos” como ortografia ainda são os mais necessários porque eles
escrevem mal demais e continuarão escrevendo mal porque continuarão ignorando a
necessidade de dar atenção ao mais simples. Dia a dia vejo alunos se afundando
na hora de escrever com dúvidas ridículas [leia-se por dúvidas ridículas
aquelas que cinco minutos atrás tinham sido tiradas ou aqueles que julga-se
que, no terceiro ano, já saibam resolver]." Deem uma olhada no texto abaixo...
A regreção da redassão
Semana passada recebi um
telefonema de uma senhora que me deixou surpreso. Pedia encarecidamente que
ensinasse seu filho a escrever.
- Mas, minha senhora -
desculpei-me -, eu não sou professor.
- Eu sei. Por isso mesmo. Os
professores não têm conseguido muito.
- A culpa não é deles. A falha é
do ensino.
- Pode ser, mas gostaria que o
senhor ensinasse o menino. O senhor escreve muito bem.
- Obrigado - agradeci -, mas não
acredite muito nisso. Não coloco vírgulas e nunca sei onde botar os acentos. A
senhora precisa ver o trabalho que dou ao revisor.
- Não faz mal - insistiu -, o
senhor vem e traz um revisor.
- Não dá, minha senhora - tornei
a me desculpar -, eu não tenho o menor jeito com crianças.
- E quem falou em crianças? Meu
filho tem 17 anos.
Comentei o fato com um professor,
meu amigo, que me respondeu: "Você não deve se assustar, o estudante
brasileiro não sabe escrever". No dia seguinte, ouvi de outro educador:
"O estudante brasileiro não sabe escrever". Depois li no jornal as
declarações de um diretor da faculdade: "O estudante brasileiro escreve
muito mal". Impressionado, saí a procura de outros educadores. Todos me
disseram: acredite, o estudante brasileiro não sabe escrever. Passei a observar
e notei que já não se escreve mais como antigamente. Ninguém mais faz diário,
ninguém escreve em portas de banheiros, em muros, em paredes. Não tenho visto
nem aquelas inscrições, geralmente acompanhadas de um coração, feitas em casca
de árvore. Bem, é verdade que não tenho visto nem árvore.
- Quer dizer - disse a um amigo
enquanto íamos pela rua - que o estudante brasileiro não sabe escrever? Isto é
ótimo para mim. Pelo menos diminui a concorrência e me garante emprego por mais
dez anos.
- Engano seu - disse ele. - A
continuar assim, dentro de cinco anos você terá que mudar de profissão.
- Por quê? - espantei-me. -
Quanto menos gente sabendo escrever, mais chance eu tenho de sobreviver.
- E você sabe por que essa
geração não sabe escrever?
- Sei lá - dei com os ombros -,
vai ver que é porque não pega direito no lápis.
- Não senhor. Não sabe escrever
porque está perdendo o hábito da leitura. E quando o perder completamente, você
vai escrever para quem? Taí um dado novo que eu não havia considerado.
Imediatamente pensei quais as utilidades que teria um jornal no futuro: embrulhar
carne? Então vou trabalhar num açougue. Serviria para fazer barquinhos, para
fazer fogueira nas arquibancadas do Maracanã, para forrar sapato furado ou para
quebrar um galho em banheiro de estrada? Imaginei-me com uns textos na mão,
correndo pelas ruas para oferecer às pessoas, assim como quem oferece hoje
bilhete de loteria:
- Por favor, amigo, leia - disse,
puxando um cidadão pelo paletó.
- Não, obrigado. Não estou
interessado. Nos últimos cinco anos a única coisa que leio é a bula de remédio.
- E a senhorita não quer ler? -
perguntei, acompanhando os passos de uma universitária.
– A senhorita vai gostar. É um
texto muito curioso.
- O senhor só tem escrito? Então
não quero. Por que o senhor não grava o texto? Fica mais fácil ouvi-lo no meu
gravador.
- E o senhor, não está
interessado nuns textos?
- É sobre o quê? Ensina como
ganhar dinheiro?
- E o senhor, vai? Leva três e
paga um.
- Deixa eu ver o tamanho - pediu
ele.
Assustou-se com o tamanho do
texto:
- O quê? Tudo isso? O senhor está
pensando que sou vagabundo? Que tenho tempo para ler tudo isso? Não dá para
resumir tudo em cinco linhas?
(Carlos Eduardo Novaes)
Colaboração>
ANÁLISE DE TEXTOS
Acesso: 16.11.2013
adorei o texto! é a mais pura realidade deste século...
ResponderExcluirVerdade, xará. Que bom que tenhas gostado.
ExcluirUm cheirinho!