O chamado das Pedras
A estrada está deserta.
Vou caminhando sozinha.
Ninguém me espera no caminho.
Ninguém acende a luz.
A velha candeia de azeite
de lá muito se apagou.
Tudo deserto.
A longa caminhada.
A longa noite escura.
Ninguém me estende a mão.
E as mãos atiram pedras.
Sozinha...
Errada a estrada.
No frio, no escuro, no abandono.
Tateio em volta e procuro a luz.
Meus olhos estão fechados.
Meus olhos estão cegos.
Vêm do passado.
Num bramido de dor.
Num espasmo de agonia
Ouço um vagido de criança.
É meu filho que acaba de nascer.
Sozinha...
Na estrada deserta,
Sempre a procurar
o perdido tempo que ficou pra trás.
Do perdido tempo.
Do passado tempo
escuto a voz das pedras:
Volta...Volta...Volta...
E os morros abriam para mim
Imensos braços vegetais.
E os sinos das igrejas
Que ouvia na distância
Diziam: Vem... Vem... Vem...
E as rolinhas fogo-pagou
Das velhas cumeeiras:
Porque não voltou...
Porque não voltou...
E a água do rio que corria
Chamava...chamava...
Vestida de cabelos brancos
Voltei sozinha à velha casa deserta.
- Cora Coralina, "Meu Livro de Cordel", 8°ed.,
1998.
Foto: do livro "Cora Coralina - Coração do
Brasil", pág. 13 - Museu da Língua Portuguesa. São Paulo, 2009. [Acervo do
Museu Casa Cora Coralina].
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